domingo, 30 de janeiro de 2022

Epidemiologia e Serviços de Saúde 2019; 28 (3)

 A 16a Conferência Nacional de Saúde foi o maior evento de participação social realizado no país. Participaram mais de 5 mil pessoas, incluindo conselheiros de saúde, representantes de movimentos sociais, usuários, trabalhadores e gestores do Sistema Único de Saúde (SUS), que se reuniram em Brasília, DF, de 4 a 7 de agosto de 2019. Este grandioso evento foi organizado pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS) e realizado pelo Ministério da Saúde (MS). O tema escolhido, “Democracia e Saúde”, e a referência à “8ª+8” marcaram o resgate da histórica 8ª Conferência Nacional de Saúde, realizada em 1986. 

A 8a Conferência foi o primeiro evento nacional com participação social na área da saúde. Seu relatório final1 recomendou a formação de um sistema único de saúde, separado da previdência. Também resultou na criação da Comissão Nacional da Reforma Sanitária (CNRS),2 que teve papel preponderante na elaboração da proposta que culminou na inclusão do direito à saúde e na instituição do SUS, na Constituição Federal de 1988.3 Mais de 4.600 conferências, que totalizaram cerca de 1 milhão de participantes, realizadas em todos os estados brasileiros e no Distrito Federal, antecederam a 16a Conferência Nacional de Saúde. Também trouxeram contribuições para o debate 63 conferências livres, organizadas de modo independente por entidades de trabalhadores, usuários, instituições de ensino superior, fóruns e gestores municipais e estaduais.

 O Relatório Nacional Consolidado4 da 16a Conferência sintetizou as melhores posições e orientações para a defesa e o fortalecimento do SUS, a melhoria das condições de saúde da população e a construção de relações mais saudáveis e democráticas no setor saúde e na sociedade como um todo. As propostas foram organizadas em três eixos: I – Saúde como direito; II – Consolidação dos princípios do SUS; e III – Financiamento adequado e suficiente para o SUS. Os debates ocorridos durante a 16a Conferência Nacional de Saúde culminaram com a aprovação de 31 diretrizes e 329 propostas provenientes de todos os estados e do Distrito Federal, além de 56 moções, contempladas em seu Relatório Final.5 A 16a CNS foi um marcante momento para a democracia brasileira e para o SUS. 

O evento rememorou e reverberou o discurso de Sergio Arouca,6 Presidente da 8a CNS, e protagonista da criação do SUS: que [as pessoas] tenham direito à casa, ao trabalho, ao salário condigno, à água, à vestimenta, à educação, às informações sobre como dominar o mundo e transformá-lo. (...) ao meio ambiente que não lhes seja agressivo, e que, pelo contrário, permita uma vida digna e decente. (...) a um sistema político que respeite a livre opinião, a livre possibilidade de organização e autodeterminação de um povo, e que não esteja todo tempo submetido ao medo da violência, daquela violência resultante da miséria, e que resulta no roubo, no ataque. Que não esteja também submetido ao medo da violência de um governo contra o seu próprio povo, para que sejam mantidos interesses que não são do povo.6 A magnitude da 16a Conferência Nacional de Saúde reflete a grandiosidade e a potência do SUS, que embora ainda apresente desafios para o pleno alcance de seus princípios, é indiscutivelmente um patrimônio da população brasileira, e portanto deve ser preservado e fortalecido.

Alguns artigos:

Acesso aos serviços de saúde para o diagnóstico e tratamento da tuberculose entre povos indígenas do estado de Rondônia, Amazônia Brasileira, entre 2009 e 2011: um estudo transversal*

Análise espacial dos óbitos infantis evitáveis no Espírito Santo, Brasil, 2006-2013*

Tendência de mortalidade por câncer de pulmão em diferentes contextos urbanos do Brasil, 2000-2015*

 Disponível em: Epidemiologia e Serviços de Saúde 2019; 28 (3)




Epidemiologia e Serviços de Saúde 2019; 28 (2)

 O Programa Nacional de Imunizações (PNI), criado em 1973 – antes mesmo da criação, em 1988, do Sistema Único de Saúde (SUS) –, foi determinante para o controle bem-sucedido das doenças imunopreveníveis no Brasil. Sua atuação contribuiu sobremaneira para melhorias importantes na situação de saúde da população brasileira. São exemplos: a erradicação da varíola; a eliminação da poliomielite e da febre amarela urbana, da circulação do vírus do sarampo (2016) e da rubéola (2015); assim como a redução da incidência da difteria, da coqueluche, da meningite causada por H. influenzae tipo B, do tétano, da tuberculose em menores de 15 anos de idade, e, mais recentemente, das meningites e pneumonias.1 A redução da incidência e da mortalidade por doenças imunopreveníveis, especialmente nos primeiros anos de vida, teve notáveis reflexos no aumento da esperança de vida e na redução de hospitalizações.2-4 O rol de vacinas ofertadas pelo SUS foi incrementado ao longo do tempo. Atualmente, são disponibilizadas 19 vacinas para mais de 20 doenças. O Calendário Nacional de Vacinação, tal como ocorre nos países desenvolvidos, contempla não apenas as crianças, mas também adolescentes, adultos, idosos, gestantes e povos indígenas.5 O sucesso do PNI e sua crescente complexidade, entretanto, têm se tornado um obstáculo para a manutenção das coberturas vacinais adequadas. À medida que as pessoas não convivem mais com as mortes e incapacidades causadas pelas doenças imunopreveníveis, passam a não mais perceber o risco que estas doenças representam para a sua própria saúde, para os membros de sua família, e para a comunidade.6 Nesse cenário, aparecem o medo dos eventos adversos e a circulação de notícias falsas sobre os imunobiológicos, que se sobrepõem ao conhecimento sobre a importância e os benefícios das vacinas. Os movimentos antivacina,7 embora não sejam muito atuantes no Brasil, estão cada vez mais frequentes e persuasivos, e divulgam informações sem base científica sobre os riscos das vacinas. Ainda, fatores operacionais, como horários restritos de funcionamento das unidades de saúde e o sub registro das doses aplicadas no Sistema de Informações do Programa Nacional de Imunizações (SI-PNI), dificultam, respectivamente, o acesso aos imunobiológicos e o monitoramento das metas de vacinação. O intenso movimento migratório observado em país fronteiriço ao Brasil, inicialmente ocorrido para o estado de Roraima, contribuiu para a propagação do vírus do sarampo, que voltou a circular no país, especialmente nos estados da região Norte. Foram confirmados mais de 10 mil casos da doença em 2018,8 e 646 casos, distribuídos em oito estados, até julho de 2019, o que demonstra que esforços adicionais deveriam ser mobilizados para a manutenção de coberturas vacinais adequadas.9 A fim de reverter o declínio das coberturas vacinais no Brasil, o Ministério da Saúde lançou o Movimento Vacina Brasil, em 9 de abril de 2019, durante a XXII Marcha a Brasília em Defesa dos Municípios, como parte da agenda dos primeiros 100 dias de governo. A iniciativa tem como objetivo mobilizar os três níveis de gestão e diversos setores da sociedade brasileira e alertar sobre a importância da vacinação como principal medida de controle das doenças imunopreveníveis, e a única capaz de evitar a reemergência de doenças eliminadas no país. 

As estratégias para reverter a redução das coberturas vacinais devem considerar os diversos fatores que contribuem para essa situação. A comunicação social, principal estratégia do Movimento Vacina Brasil até o presente, é fundamental para ampliar o acesso às informações baseadas em evidências, especialmente sobre os benefícios da vacinação. Além da divulgação nas mídias tradicionais e eletrônicas, tais estratégias devem contemplar a busca ativa de não vacinados nas populações-alvo, parcerias com escolas e universidades, ampliação dos horários de funcionamento dos postos de vacinação, mobilização da sociedade civil e colaboração das sociedades científicas em parceria com as três instâncias de gestão, bem como o estabelecimento de parcerias intra e intersetoriais. Ademais, fomentar a produção de conhecimento, por meio de inquéritos de coberturas vacinais e de estudos acerca dos fatores associados à não vacinação, considerando-se as diferentes regiões do país, poderá contribuir na definição de estratégias complementares para o enfrentamento da situação atual.

Reconhecendo a centralidade dos recursos humanos para as ações da vigilância em saúde, em alinhamento com a Política Nacional de Vigilância em Saúde (PNPS),11 a formação e o desenvolvimento dos trabalhadores do SUS tornam-se essenciais para o alcance das metas de coberturas vacinais. A incorporação dessas estratégias nas próximas etapas do Movimento Vacina Brasil, aliadas às iniciativas já em curso, poderia alcançar milhares de trabalhadores, trabalhadoras, gestores e gestoras do SUS, em todo o território nacional, e impulsionar a reversão do declínio das coberturas vacinais.

Alguns artigos:

Associação entre desfecho do tratamento, características sociodemográficas e benefícios sociais recebidos por indivíduos com tuberculose em Salvador, Bahia, 2014-2016*


Avaliação da implantação do Sistema de Controle, Acompanhamento e Avaliação de Resultados (Sistema e-Car) na Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde do Brasil, no período de 2012 – 2015*

Disponível em: Epidemiologia e Serviços de Saúde 2019; 28 (2)